sexta-feira, 11 de setembro de 2020

DIVINDADES

 

Divindades: Divindades
Tata Kisaba Kavinajé(*)

As divindades dividem-se em: soberanas e intermediárias. E as intermediárias em: superiores, auxiliares e serviçais. As soberanas são: Zambi e Calungangombe. E as intermediárias classificam-se em: miondonas, calundus, quituas e quiandas.

SOBERANAS

Zambié o Deus das alturas promotor da existência, autor do bem e do mal, o Deus propriamente dito. Deriva de kuzamba: presentear (a vida, o mundo).

Calungangombe é o Deus das profundezas do globo – o Além-Túmulo dos aborígenes – o juiz e chefe dos mortos. Deriva de kalunga (morte) + ngombe (ruminante da família dos bovídeos). Logo, um ente voraz de vidas.

INTERMEDIÁRIAS

Miondonassão espíritos tutelares. Nascem conosco e herdam-se principalmente do ramo paterno. Defendem-nos do mal. Deriva de kukondona: limpar (do mal).

Calundussão espíritos justiceiros e medicantes. Herdam-se principalmente do ramo materno. Representam almas de pessoas que viveram em épocas remotas. Distingue-se o diculo – ancião e o diculundundo – ancião de idade mais avançada. Deriva de kulundula: herdar.

Malungassão espíritos simpatizantes. As entidades que, na vida terrena, constituíram indivíduos da raça branca, assumem, por influência do catolicismo, a qualificação particular “santo”.  Deriva de M’akuá-lunga: relativos aos do Além.

Quitutassão gênios. Vivem em toda a parte, como nas matas, rios, cacimbas, montes, rochas. Embora raramente, podem-se mostrar em forma de bichos, denunciando bons ou maus presságios. Deriva de kututa: transportar (em si).

Quiandassão as sereias. Vivem na água, principalmente no mar, podendo mostrar-se sob qualquer aspecto – pessoas, peixe, coisa. Suas aparições, tal qual aos quitutas, representam bons ou maus indícios. Deriva de kuenda: andar (indo com alguém).

Complementando as definições de espírito, vamos agora apresentar as de alma. Segundo o autor, espírito é uma alma evoluída, ou através de possessões seculares, ou através de sucessivas transmigrações – argumento este verificado no conto Quimalauezo, inserto no I vol. De Missosso, não como elemento de evolução, mas como um retorno à vida.

Muenhoé a vida ou alma de vivente. Em sonho, desprende-se da matéria, vagueia pelo espaço. Deriva de kumuena: ver in loco.

Dele ou Zumbié alma de pessoa falecida recentemente, num período não secular. O aportuguesamento de zumbi é canzubi. E de dele, proveio a expressão mundele – indivíduo de raça branca. Pela decomposição – mukuá-ndele – apura-se a comparação: possuidor de alma, semelhante a alma. Os termos derivam, respectivamente, de kuzumbika e kuendela, ambos os verbos significando perseguir (a mandado de feiticeiro). As almas e espíritos são designados pelos termos: akuá-Lunga (os do Além) e akuá-moxi-ia-mavu (os de debaixo da terra).

Quituloé alma penada. Deriva de kutula: amargar.

Muculoé a alma de pessoa acabada de falecer, ou mesmo falecida há poucos anos, a qual actua noutrem, ou par lhe revelar um segredo, ou para lhe legar o seu saber e a sua corte de espíritos. Deriva de mukuá-ukulu: indivíduo do tempo antigo; que viveu noutro tempo.

Fonte:ILUNDO – Divindades e Ritos Angolanos, Oscar Ribas.

(*)Espedito é Tata Kisaba iniciado por Mam’etu Jiboin diá Nzambi. Atualmente é mona dia Mukixi de Tata Talamonakô, dirigente dos Terreiros Tumbalê Junçara e Kianvulá – Ba

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sábado, 29 de agosto de 2020

NZINGA MBANDI (RAINHA GINGA).

 

História e Cultura: Nzinga Mbandi – 1580-1663
No dia 17 de Dezembro de 1663, morreu o maior símbolo da resistência angolana.

Texto elaborado por Kwzola dya Nzambi (*)
No princípio do século XVII, ao mesmo tempo em que Cristina da Suécia foi formalmente nomeada monarca do seu país, outra mulher em Angola, filha do rei Ngola Kiluanje kya Samba, foi também reconhecida como monarca. 343 anos após a sua morte, Angola e o mundo, recordam-na como Rainha Ginga.
Rainha Ginga e os portugueses

Nzinga Mbandi nasceu em 1580, quando Angola começava a ser ocupada pelos portugueses. Os profetas do reino iluminados por Nzambi, vaticinaram, caso ela chegasse à idade adulta e se tornasse rainha, os rios do reino seriam inundados pelo sangue de muitas vítimas. Previram também que a nação seria invadida por homens brancos vindos do mar e que haveria doenças, fome, guerras, tristezas e miséria em Angola por muitos séculos.

Apesar de suas relações com os europeus, Nzinga passou a posteridade como a líder angolana que nunca aceitou a soberania portuguesa. Não aceitava a submissão, não pagava impostos! Os portugueses tiveram de esperar cerca de trinta anos para assinar um tratado de paz com esta poderosa mulher que na História de Portugal ficou conhecida por Ana de Sousa.

Rainha Nzinga Mbandi, também conhecida por Jinga, Singa, e Zhinga, política ardilosa soube conter os portugueses com acordos bem preparados. Empreendeu várias viagens e, finalmente em 1635, conseguiu formar uma grande coligação com estados de Matamba e Ndongo, Congo, Kassanje, Dembos e Kissamas. À frente da poderosa coligação, Nzinga rechaçou os portugueses para posições mais recuadas. Entretanto Portugal fora ocupado pela Espanha, ficando com as terras de além mar votadas para ao plano secundário. Os holandeses aproveitar-se-iam dessa situação e tomariam Loanda em 1641. Nzinga fez dos holandeses seus aliados, aumentando a força da coligação e reduzindo os portugueses a Massangano, praça que estes ocupavam fortemente e de onde partiam esporadicamente para as guerras de Kuata! Kuata! ( captura de escravos).

Os escravos de Angola eram fundamentais para o desenvolvimento da colônia do Brasil e o seu tráfico encontrava-se parado. Em 1648, chegaria do Brasil, uma grande esquadra comandada por Salvador Correia de Sá que retomaria Loanda, provocando a volta maciça dos portugueses. Começa então o declínio da Coligação; a falta do aliado holandês e das suas armas de fogo e a posição de força de Correia de Sá vibraram um duro golpe na moral das forças autóctones.

Introduzida na sala para negociar a paz com o governador João Correia de Sousa, Nzinga olhou ao seu redor e como havia apenas uma cadeira e duas almofadas de veludo franjadas de ouro, sobre uma rica alcatifa, sustendo-se algum tempo, sem proferir palavra, voltou o rosto para uma das suas escravas. Foi esta imediatamente servir-lhe de banco e assentando-se sobre ela, assim esteve todo o tempo que durou a cerimônia.

Da Rainha Nzinga Mbandi aos heróis do 25 de Abril de 1974

Uma única luta contra o inimigo comum: O fascismo!

A colonização dos povos de Angola aconteceu no passado, a partir do século XVI, através de métodos fascistas. Métodos esses repudiados tanto pela Rainha Nzinga e seu povo, como pelo povo português, que durante muitos anos, empenhou-se na luta contra esse sistema feroz. A queda do regime fascista em Portugal, culminou na independência de Angola um ano depois.

“O fascismo significa miséria, opressão, espezinhamento das consciências. Começa por destruir todas as organizações e acaba por tornar-se o senhor absoluto, “integral”, que não respeita ideologias, nem admite divergências. Fere e amordaça, esmaga e assassina. Toda a sociedade, sem exceção, obedece ao seu controle e ao seu domínio. Não existe garantia de qualquer espécie, nenhuma segurança é oferecida aos cidadãos. Os domicílios são violados, os lares constantemente invadidos para as perseguições. O Homem do povo fica reduzido à situação de um animal acorrentado, que não fala, nem pensa, nem escreve, nem trabalha, senão sob o chicote dos seus verdugos. A dignidade humana, a fraternidade, a ligação confiante entre os homens desaparecem. Cada indivíduo vê no seu semelhante um inimigo e um espião que o entregará, na primeira oportunidade, à ferocidade dos governantes. O fascismo é a morte certa para os que protestam. Acima de quaisquer interesses de classe ele é, essencialmente, desumano é anti-humano”.

A luta da Rainha Nzinga, não era contra os portugueses, mas sim, contra o fascismo português implantado em Angola, em forma de colonização.

Rainha Ginga e a Santa Sé

Ginga de Matamba a rainha negra, intercedeu junto do Papa Alexandre VII, para que Angola se tornasse oficialmente, uma nação cristã. Em 1621, a Rainha Ginga de Matamba com uma vistosa comitiva foi então propor a paz, em Luanda. Aceitou certas condições que lhe foram impostas e batizou-se em 1622, com o nome de Dona Ana de Souza, na igreja matriz de Luanda, mas não aceitava a submissão, não pagava tributos. No ano seguinte, moveu ela mesma guerra aos portugueses, depois de ter matado o irmão que assassinara seu filho. Ficou então como rainha dos dois reinos e seus povos. Foi então que ela permitiu que o capuchinho italiano Antônio Gaeta (+1662) morasse no seu reino. Gaeta levou-a a mudar de vida. Contra a vontade dos portugueses, Ginga mandou uma embaixada ao Papa Alexandre VII pedindo o reconhecimento do seu reino. O Papa enviou-lhe uma carta pessoal e outra da Sagrada Congregação da Propaganda Fide com orientações para que seu reino fosse cristão, enviou mais missionários capuchinhos italianos e nomeou o Pe. Antônio Gaeta como prefeito apostólico da Matamba. A carta da S.C.da Prop. Fide contém entre outras uma “proibição aos comerciantes e a qualquer outras pessoas de comprar como escravos os batizados. A..Muaca em “Breve História da Evangelização de Angola.1491-1991″ (Lisboa, Secr. Nac. das Comemorações dos 5 Séculos,1991.p.35).

Rainha Ginga, mulher de fé e oração

A rainha Nzinga Mbandi ou Ginga-Aména (do reino de Matamba), chamada pelos portugueses de Dona Ana de Sousa, ao hospedar os portugueses para com eles ter amizade e comércio, viu-se perseguida de tal forma que levantou as mãos para o céu, e assim, orou à Nzambi:

Jingundu jéza!

mu tambúla

o ’xi iami,

sé kituxi, sé milonga!

Tradução: os inimigos vieram para tomar a minha terra, sem crime, sem causa!

Eis aqui a origem da palavra ngundu, aplicada no passado aos portugueses que colonizaram Angola. Quer dizer, inimigo consumado, traidor.

Rainha Ginga, lembrada da Diáspora Bantu

Na África, como nas Américas, os angolanos resistiram à dominação colonial e à escravidão. Foi uma luta marcada por batalhas sangrentas, negociações, atos heróicos e traições. Nos combates dos africanos contra o colonialismo português, uma mulher, contemporânea de Zumbi dos Palmares, destacou-se como símbolo de coragem e persistência. Ela foi N’Zinga Mbandi, ou Ginga, como ficou conhecida no Mundo, a grande rainha do povo negro de Angola: Rainha Quilombola da Matamba!

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Importantes datas da vida da Rainha Ginga
1580 – Nascimento de Nzinga mbandi

1590 – Participação na batalha de Massangano com o pai Ngola Kiluanje

1617 – Morte do pai, rei Ngola Kiluanje

1621 – Assinatura do tratado de paz com os portugueses

1622 – Baptismo católico

1623 – Inicio do reinado, no Ndongo

1625 – Estabelecimento do acampamento de guerra

1626/40 – Intensas batalhas contra os portugueses, coligação com os reinos da Matamba, Ndongo, Congo, Kassanje, Dembos e Kissamas

1630 – Consegue-se que as lutas tribais acabem, fazendo aliança com o chefe jaga

1641 – Aliança com os portugueses

1645 – A rainha Nzinga cerca os portugueses que se encontravam em Massangano

1647 – Consolidação da tripla aliança Ginga-Rei do Congo-Holandeses

1648 – Derrota os portugueses em Massangano

1650 – Tratado de paz com os portugueses

1651 – Autorização da entrada dos missionários no seu reino

1657 – Assinatura do novo tratado de paz com os portugueses

1658 – Casamento de Ginga com Dom Salvatore

1659 – Ultima batalha vitoriosa de Ginga

1660 – Conversão final ao catolicismo

1662 – Ginga mandou uma embaixada ao Papa Alexandre VII

1663 – 17 de Dezembro de 1663, morre a poderosa Rainha Ginga, com 83 anos de idade

O óbito de Nzinga

Por ocasião das cerimónias fúnebres (tambi) em honra da rainha Njinga (cujo nome cristão era Ana de Souza), em 1663 no reino de Matamba, cerca de 8000 soldados, por cinco dias, participaram de danças rituais que simulavam batalhas conforme a descrição do padre Cavazzi, que assistiu pessoalmente aos ritos:

“ No mesmo instante foi dado o alarme e todos os soldados, com o porte mais feroz que se possa imaginar, começaram a representar as façanhas de dona Ana, imitando-a no assalto, na retirada, na preparação das ciladas, na defesa, na perseguição dos inimigos. Um esquadrão defrontava outro, num arremedo de peleja em que uns fingiam ceder o lugar, outros defendê-lo e outros reconquistá-lo.

Alguns caíam como mortos, outros rendiam-se prisioneiros. Um grupo fugia, depois recompunha-se; outro vencia, outro descansava um bocado. Era tão encarniçada aquela fingida batalha, que qualquer pessoa a teria julgado verdadeira.” João António Cavazzi de Montecúccolo, Descrição histórica dos três reinos do Congo, Matamba e Angola, tradução, notas e índice do Padre Graciano Maria Leguzzano, Lisboa, Junta de Investigação do Ultramar, 1965, vol II, livro sexto, p. 156. 20 “Eles eram de compleição robusta e sadia, rosto negro, muito ágeis de membros, que ungiam para maior facilidade de movimento. Vimo-lhes as danças originais, os saltos…

A Rainha Ginga foi venerada por muitos seculos pelos angolanos, como ancestral divinizada: MATAMBA – Divindade feminina, senhora dos ventos, das tempestades, guerreira. Luta por tudo e por todos. Não admite ser traída e se for preciso mete-se em luta com homens. O seu espirito continua vivo, entre os angolanos. A capela da Santana (por ela mesma construída) é o ponto de encontro com os vivos que ainda a veneram. No passado, muitos milagres ocorridos na capela da Santana foram atribuidos a intercessão da Rainha Ginga.

(*) Rosário Fernandes é formada em naturalismo e medicinas orientais pelo Stonebridge Associated Colleges da Inglaterra, pesquisadora de medicinas tradicionais antigas e atua na área de medicinas complementares.

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PERFIL ETNO-HISTÓRICO DO POVO ANGOLANO

 


História: Perfil Etno-Histórico do Povo Angolano
Tata ria Nkisi Otuajô(*)
A base ético-linguística de Angola compreende os grupos populacionais BANTU e uma minoria não -BANTU, os VASSEQUELE.

OS BANTU
Habitando não só Angola mas também a África Central, Meridional e Oriental, o povo Bantu constitui um grupo especial entre os negros da África. Eles têm três elementos comuns sobre os quais nenhuma contestação é possivel:a) O mesmo sistema linguístico; b) Uma civilização base;c) Unidade nas ideias filosóficas.

Na vastidão das áreas que ocupam, a arrancada rumo ao progresso não se deu num dia nem obedeceu, depois, a uma velocidede uniforme. Assim, no progresso histórico do desenvolvimento da sociedade, uns avançaram mais que os outros.

O povo Bantu desenvolveu a metalurgia, a agricultura, a criação de gado,a pesca, o que lhe dava uma ascendência económica e militar.

A influência do meio geográfico, o modo de vida e a influência linguística de outros povos fazem com que existam em Angola nove grupos étnico-linguísticas. Também conforme o grau de desenvolvimento, o crescimento demográfico e o nível de organização, os grupos ético-linguísticos mais fortes tinham formado Reinos que marcaram a sua história. Assim temos:

BAKONGO: O grupo étnico-linguístico Bakongo, ocupa o Norte e o Noroeste de Angola, na área que abrange Cabinda até às linhas do rio Dande. A língua falada é o Kikongo.

Repartidos aquando da partilha do Continente Africano pelos países colonialistas, uma parte desse grupo passou para as actuais Repúblicas do Congo e Zaire.

A tradição ancestral diz-nos que foi um chefe chamado Nimi a Lukeni que reuniu no passado todos os clãs que falavam Kikongo, fundando o Reino do Congo, com capital em Mbanza Kongo, situada na província Angolana do Zaire.

Povo trabalhador e comerciante adoptou a moeda “njimbu” que consistia de conchas marinhas, muito antes da chegada dos Portugueses, o que assegurou o apogeu comercial do grande Reino do Kongo. Dada a situação geográfica, foi o primeiro Reino contactado pelos portugueses, em 1482.

Kimbundu: Vizinho imediato dos Bakongo, a sul, entre os rios Dande e Cuanza, o grupo étnico-linguístico Kimbundu espalha-se de Luanda até aos Lunda-Chokwes e confina a sul com os Ovimbundu. Antes da população Portuguesa, os Kimbundu tinham formado os Reinos do Dondo, Matamba e Estados da Kissama, onde florescia a agricultura e o comércio.

Primeiro grupo invadido militarmente pelos Portugueses, a partir dos meados do século XVI, a história nunca poderá esquecer-se dos seus grandes feitos heróicos na resistência contra a dominação estrangeira, sob o comando dos seus chefes, de que a Rainha Nzinga é expoente máximo do século XVII.

Compelidos de várias formas a conviver com os Portugueses durante séculos, os Kimbundu sofreram inflência Portuguesa, intensiva aqui e extensiva acolá, com a fundação das primeiras instituições escolares na área, o que afectou sobremaneira a sua base cultural Bantu. Em contrapartida, surgiram entre eles os primeiros passos da literatura em Angola.

OVIMBUNDU: Grupo étnico-linguístico mais numeroso, ocupa o Planalto Central de Angola nas Províncias de Benguela, Huambo, Bié, na maior parte do Cuanza Sul e no Norte da Huíla. A sua língua, umbandu não tem fronteiras no interior do País e marca presença forte no Zaire, na Zâmbia e na Namíbia.

Grandes comerciantes e agricultores dedicados da África Austral, os Ovimbundu repisaram o sub-continente do Atântico ao Índico e promoveram um intercâmbio forte de experiências e valores culturais, o que marcou fundo a sua psicologia, que faz da convivência com outros povos a sua característica principal. É históricamente conhecido como trabalhador, hospitaleiro e paciente, mas implacável quando lesado nos seus direitos. Durante a ocupação colonial, sofreu grande influência Cristã e atingiu o maior índice no País de alfabetização e de quadros intelectuais e técnicos de níveis básico, médio e superior.

Os Ovimbundu formaram vários Estados antes da ocupação colonial,de entre os quais se destacaram os seguintes: Mbalundu, Wambu, Viye, Ndulu, Ngalangui e Chiaka. Estes Estados constítuiram uma divisão administrativa da vasta área e não do seu povo unido e amalgamado na língua, cultura, tradição e carácter comum do poder – o Poder Democrático. Foram Estados fortes pela alma do seu povo, que sempre acreditou ser povo da terra dos destemidos, dos guerreiros. Ao lado das narrações, lendas e adágios, a canção testifica o passado: Kapalandanda wa lila; wa lilila ofeko yahe yilo ofeka yoku loya, ka loyele a tunde ko!… – Kapalandanda chorou, chorou pela sua terra…Esta é terra de combate, quem não luta, saía! O que ficaconsubstancia a mensagem secular do grito da liberdade “TERRA E LUTA ARMADA”.

LUNDA-CHOKWE: Ocupa as província da Lunda, parte do Moxico e está também dissiminado nas províncias do Cuando-Cubango, Huíla e leste do Bié e compreende os Lunda-Lua Chimbe, Lunda-Demba e Chokwe. A tradição conta que os Chokwe, negando ser tributários do Rei Lunda, expandiram-se numa vasta região do Moxico, Bié, Cuando-Cubando e Huíla. Antes da sua expanção, os Chokwe permaneceram estreitamente ligados ao Império Lunda, até que fundaram vários Estados.São comerciantes, caçadores e apicultores, o que faz da área dos Lunda-chokwe um centro comercial importante com os povos do planalto central até aos princípios deste século.

NGANGUELA: Povoando as províncias do Cuando-Cubango, moxico e parte do Cunene e Huíla, o grupo étnico-linguístico Nganguela compreende os Luimbi, Luchaze, Bunda, Luvale, Mbuela, Kangala, Massi e Yavuma. Os Nganguela destacam-se como pescadores (os Luvale são exímios pescadores que não se deizam influenciar pela época do ano) e notáveis apicultores.Vivendo longe da costa do Atlântico e num habitat disperso, os Nganguela só foram dominados pelos portugueses a partir dos anos de 1920, dominação esta que sofreu resistência dos Bunda, chefiados pelo seu dirigente Muene Bandu, assim como dos Nhemba, com o Rei Chilhauku.

Divididos em sub-grupos, não tiveram autoridade centralizada; contudo formaram importantes Reinos, dentre os quais se destacaram os Reinos do Kubango, de Massaka, ou da Raínha Lussinga, de Senge e dos Luvale, sob a prestigiosa dinastia Nhakatolo.

NHANEKA-HUMBI: Vizinhos dos Ovimbundu e dos Ovambo os Nhaneka-Humbi espalharam-se por Províncias da Huíla e do Cunene e compreendem entre outros, os Muíla, Humbi e Gambo. Dedicando-se à pastorícia e praticando uma fraca agricultura, de vida semi-n´mada, tiveram reinos fortes que resistiram ao colonialismo.

OVAMBO: Ocupando a Província de Cunene, entre o paralelo 16ª e a fronteira com a Namíbia, é constituído por Kuanhamas, Kuamatuis, Evales e Kafimas. Praticando uma agricultura de subsistência, tem a sua base económica na criação de gado que, por factores climáticos e baixo nível de desenvolvimento, não se libertou da vida semi-nómada. Sente-se ainda o calor de Mandume, que conseguiu unir o povo e fazer resistência forte aos Portugueses até Stembro de 1917. A sua capital foi Onjiva, cujo nome foi novamente retomado em substituição de Pereira d`Eça, nome que fora dado pelos Portugueses.

HERERO: O Herero é também um dos grupos populacionais do nosso País que se espalha na Província de Moçamedes, Sul de Benguela e Oeste de Huíla. Tal como seus vizinhos Nhaneca- Humbi e Ovambo, dedica-se à criação de gado. Cada um vê no gado graúdo o seu capital e nas crias o seu lucro final.

KUANGAR-BUKUSSO: O grupo linguístico Kuangar-Bukusso ocupa toda a faixa Sul da Província do Cuando-Cubango. Agricultores pacientes devido à acção cíclica da estiagem, têm a sua economia na criação de gado. Também praticam a pesca nos rios Cubango e Cuando.

OS VASSAQUELE: Os Vassequele constituem um grupo numericamente muito reduzido, que se encontra na Província do Cunene e no sul do Cuando-Cubango. Caçadores infatigáveis, têm sido nómadas ao longo dos tempos. Porém com a influência dos povos Bantu, quase todos adoptaram a vida sedentária, fazendo pequenas lavras, sem terem deixado a caça e a procura de fruta e mel.

Os Vassaquele possuem uma linguagem especial, caracterizada por “clics” ou estalidos. Foram os autores das maravilhosas pinturas que se encontram nos rochedos, em muitas grutas do Sul de Angola, como na gruta do Chitundo-Hulo no deserto de Moçâmedes.

Fonte: http://kimbolagoa.blogs.sapo.pt/30072.html

(*) Julio Guimarães é graduado em Administração de Empresa e pós-graduado em Gestão de Recursos Humanos. Foi iniciado no candomblé em 04-02-1984 e hoje pertence a Ndanji ua Tombeici. Atualmente dirige sua própria Inzo – ABASSA KUA BUALA NGANA ROXE MUKUMBE XIBULU UA NZAMBI – RJ

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sexta-feira, 28 de agosto de 2020

RITOS FÚNEBRES

 


História e Cultura: Ritos Fúnebres
Mam’etu Nibojí(*)
São, junto com os ritos de puberdade, as cerimônias religiosas e os ritos melhor observados e solenizados da sociedade bantu. Como ritos de iniciação, estão cheio de conteúdo religioso, aparato litúrgico e participação comunitária.
Nos ritos fúnebres, nos quais, sem desculpa, devem participar todos os familiares aos quais se junta a comunidade, os bantu patenteiam as suas raízes culturais, fundamentos filosóficos, “dogmas” religiosos e celebram com solenidade o mistério da vida participativa

Nenhum outro rito chega a atingir a sua transcendência. Caracterizam as suas crenças e consolidam um dos valores religiosos mais preciosos: a certeza da sobrevivência do homem no além-túmulo.

Pelo nascimento, o bantu “passou” a este mundo e pelos ritos de puberdade à sociedade. Pelos ritos fúnebres se restabelece a comunhão que lhe assegura a sobrevivência.

Consideram o defunto como um ser em devir, um projeto, que deve chegar à plenitude, à realização definitiva de antepassado. Encerram tal casualidade mística, que se convertem na única ponte de passagem entre os dois mundos.

Se se realizarem segundo a tradição e o desejo dos antepassados, o defunto chegará ao seu destino transformado na sua realidade existencial, já que se opera uma mutação ôntica.

Pelo contrário, se se realizarem com descuido ou forem deformados, o defunto esquecido vagueará sem destino, desgraçado, e o olvido dos seus acarreta desprezos e terríveis vinganças para os vivos. Converte-se num perigo permanente e pode ocasionar males.

Estes ritos, em definitivo, são um culto à vida, o tributo mais solene que o bantu lhe rende, porque assegura vida constante ao membro que “passou” e enriquece a sua comunidade. São celebrações  solenes do duplo nascimento para a vida mais rica, individual e comunitária.Como exceção, parece que certos grupos bantu camitizados, porque desejam apropriar-se da força vital dum defunto e evitar as suas possíveis cóleras, “comem o defunto em comum na noite dos funerais, depois queimam os ossos. Apropriam-se assim das virtudes do morto e asseguram, pelo seu desaparecimento, que não voltará a inquietá-los”.

Só se “morre” verdadeiramente quando se realizaram os ritos segundo a tradição e a comunidade tem a certeza de que o defunto foi recebido pela comunidade dos antepassados. O defunto fica naturalizado no além-túmulo, integra-se na comunidade dos antepassados pela ação eficaz dos vivos que o situam no seu lugar, o “fixam” evitando que fique vagabundo e despeitado.

A solenidade dos ritos está em proporção com o prestígio social e, sobretudo, com a influência vital do defunto. Os Chefes merecem honras especiais que se revestem da maior solenidade, com a reunião da comunidade. Assim conservam o seu estatus social no outro mundo e não guardam ressentimentos contra as suas comunidades que, por outro lado, desejam prestigiar-se com pomposas festas. As comidas, bebidas e danças adquirem tal relevo, que não há festa que as supere. Vi, nestas ocasiões, sacrificar até quinze bois! As festas poderão prolongar-se por um mês se o Chefe for importante.

Está bastante espalhado o costume de deixar corromper o cadáver do Chefe até que a cabeça se desprenda do tronco. O crânio deve ficar para o herdeiro como feitiço protetor. Às vezes arrancam-lhe as unhas para fabricar poderosos feitiços ou manter viva a sua presença, já que a sua personalidade se prolonga até aí.

O luto pelo Chefe pode durar várias semanas e obriga a todos. O trabalho é proibido. Nalgumas partes a infração castigava-se com a morte. Os que morriam durante o luto não podiam ser enterrados. Os escravos não tinham honras fúnebres visto que a sua nula influência social não os tornava temidos nem havia interesse algum em os prestigiar como antepassados.

A infâmia de certas enfermidades ou a brutalidade do rompimento da vida não oferecem garantias duma ação benéfica. Além disso, seria um insulto aos antepassados. Assim, são excluídos do grupos dos antepassados os leprosos, os que morrem de acidentes, os suicidas, os tarados psíquicos, os epiléticos e os celibatários. As crianças, sobretudo se ainda não foram “chamadas”, e os jovens recebem honras muito mais simples, e a comunidade não precisa de lhes prestar culto. Pela sua imaturidade e pouca influência vital não preocupam.

Os que violaram com gravidade a ética comunitária, criminosos, ladrões, vítimas de ordálios, inimigos públicos e, sobretudo os feiticeiros confessos ou acusados, não recebem honras fúnebres. A sociedade condiciona a honra de antepassado ao comportamento ético.

Logo depois de morrer, enterram os feiticeiros, quase sempre mutilados (partindo-lhes as pernas, por exemplo) para que não voltem, ou abandonem-nos aos animais, ou queimam-nos e dispersam as suas cinzas ou lançam-nas à água.

Há grupos que crêem que os condenados por feitiçaria se revestem no além e um corpo insignificante, repugnante, com um cheiro nauseabundo e com cabeleira encarnada. Levam uma vida errante por regatos e mananciais, encarnam em bestas ou em gatos(por isso rejeitam este animal) e comem carne humana. Castigados a não participar na vida dos seus parentes, dedicam-se a transtornar o ritmo de vida individual e comunitário.

Logo que uma pessoa morre, os seus familiares começam a chorar, a gritar e a dançar sem cessar, com um ritmo cadenciado e monótono. Lamentam a sua perda, chamam-no pelo seu nome, agradecem os seus favores, exaltam as suas virtudes, amaldiçoam o causador da morte e desejam a felicidade ao defunto. Os parentes e amigos acompanham a gritaria com gestos, contorções e danças. Assim demonstram aos antepassados a bondade do falecido, que procuram contentar para que não regresse carregado de influência nefastas. As festas, além disso, entretêm e dão coragem ao defunto enquanto espera a sua transformação em antepassado.

Lavam o cadáver, vestem-lhe as melhores roupas, perfumam-no ou besuntam-no com óleo de palma. Alguns grupos, depois de o desnudar e antes que lhe chegue a rigidez, colocam-no na posição em que deve ser enterrado: sentado de cócoras, com os braços sobre o peito. Cobrem-no com um pano, manto ou pele de boi e fica sentado numa cadeira ou deitado numa esteira. Assim preside às festas. Os familiares e amigos passam pela sua frente a saudá-lo antes de participar dos ritos.

Logo que uma pessoa morre, saem os emissários a comunicar a notícia à parentela. Todos têm de ser avisados ainda que se encontrem distantes. É que o parente que não vai aos ritos pode ser acusado da feitiçaria causadora da morte. Além disso, é um dos momentos em que mais se acentua o sentimento de solidariedade comunitária já que colaboram com o parente para que encontre paz.Mesmo que trabalhem na cidade, deixam as obrigações e deslocam-se as suas aldeias. Só circunstâncias extremas podem impedir a participação nas festas fúnebres dum familiar.

As cerimônias duram dias. O cadáver costuma chegar a decompor-se. Abundam a comida e a bebida. Matam bois, cabras, porcos e galinhas. Cada familiar contribui com algum presente. As mulheres preparam as bebidas tradicionais, os instrumentos de música arrancam e a dança começa.

Comendo e bebendo, conversando e dançando, passam vários dias. São as grandes festas da sociedade bantu. E como a mortalidade é grande e a parentela extensa, encontramos o bantu em freqüentes festas.

Não se esquecem de derramar um pouco de sangue das vítimas ao redor do cadáver para que participe também, ou com ele aspergem as paredes da casa para mostrar ao defunto e aos antepassados que os sacrifícios cruentos são propiciatórios e impetratórios. De vez em quando, um dos parentes chega junto do cadáver e oferece-lhe um bocado ou um gole que entorna a seus pés ou lhe introduz na boca. Estas comidas e bebidas tentam diminuir a tristeza do morto para que se conforme com a mudança operada.

Suspeitamos, também, que estes sacrifícios de vítimas animais encerram um conteúdo sagrado, sacrifical e inclusive de aliança, que hoje se perdeu ou que não conseguimos captar. A dança e a alegria exteriorizam o prazer da participação conseguida “mistericamente”. Assim, mundo invisível e visível fundem-se na mais eficaz comunhão e o defunto honrado torna-se definitivamente comungante-participante com os dois mundos.

A maioria dos grupos sacrificam animais, sobretudo bovinos, somente nestas festas. Embora precisam de proteínas e sendo o bantu um apreciador incansável de carne, reservam os seus animais para os alambramentos e para os sacrifícios propiciatórios. Os ritos fúnebres, pela abundância de animais mortos, desempenham uma missão compensadora do desequilíbrio alimentício e da errada dietética.

Estes ritos terminam com uma refeição que consolida a familiaridade. Decorre no meio de muita alegria porque o defunto já está satisfeito, em companhia dos seus antepassados e pronto a revigorar a sua comunidade.

O enterro

Muitos grupos enterram os defuntos perto de suas casas ou dentro delas e destroem-nas quando termina o luto. É mais comum sepulta-los junto da aldeia e à beira dos caminhos para que os vivos lhes rendam uma pequena homenagem, todas as vezes que passam, inclinando a cabeça, guardando silêncio ou depositando alguma oferta no túmulo.

Encontram-se cemitérios em paragens solitárias e bem defendidas nas florestas. São cemitérios familiares, embora possam pertencer ao grupo. Normalmente cada aldeia tem um cemitério comunitário.

Os povos pastores enterram o chefe de família reduzida no curram dos bois ou no lugar onde se acende a fogueira, dentro da cerca de paus que rodeia a casa, onde enterram também as mulheres. As crianças sepultam-nas no curram dos vitelos, os jovens, junto de sua casa, as raparigas iniciadas dentro da cerca onde guardam os pilões da farinha

Os especialistas da magia, bem como os caçadores e guerreiros, quando têm renome, são enterrados à beira dos caminhos muito freqüentados ou nas encruzilhadas, e sempre ao pé duma árvore para pendurar os seus instrumentos de trabalho, armas e troféus.

Normalmente cavam na terra sepulturas horizontais com quase dois metros de profundidade. No fundo e ao lado, abrem uma câmara mortuária onde colocam o defunto deitado ou de cócoras. Isolam-na com ramos. Quando enchem a sepultura, a terra não toca no defunto. A esta câmara podem vir visitá-lo os seus familiares antepassados, e ajuda-lo a completar o rito de passagem. Outros grupos cavam as sepulturas em forma circular porque colocam o cadáver de cócoras. Alguns enterram-nos de pé. Os quibala de Angola depositam os chefes sobre a rocha e cobrem-nos com pedras bem trabalhadas, formando um sarcófago retangular. Submetem os cadáveres a uma espécie de mumificação. Introduzem-lhes pela boca, com a ajuda dum funil, óleo de palma a ferver. Esta operação prolonga-se até que as vísceras desfeitas lhes saem pelo reto.

Os que de algum modo estiveram em contato com o cadáver, os que o transportaram e em geral os acompanhantes, depois do enterro tem de tomar banho num rio para “tirar o cheiro do morto” ou lavar as mãos. Deixam sobre a sepultura algum objeto: uma cabeça de boi, uma cabaça ou garrafa com água, mel, aguardente, alguns alimentos, um copo, uma taça, um prato, qualquer instrumento de trabalho, os troféus de caça.

Com certa periodicidade ali depositam alimento e bebida. Quando enterram uma pessoa, os alimentos ajudam-na a realizar a viagem para a sua nova mansão.

Não acreditam que os mortos venham a comer e a beber às suas sepulturas. Apenas tomam “a essência das oferendas”, o seu principio vital animador, agradecem a recordação dos seus descendentes e retribuem copiosamente. Pela comida sacrificada ou ofertada, destruída, o bantu liberta a “vida essencial” da oferenda, por ela entrar em comunhão vital e reafirma a vitalidade do oferente e do oferendado.Esta sacralização do alimento compreende-se a partir da ontologia bantu. Se a vida é o valor fundante e fundamental, manifesta-se em energia, força e fecundidade. Precisa permanentemente do alimento-força. Em última análise, o alimento está na base da estrutura ontológica de todos os seres criados. Por isso contém uma finalidade sacral e ele próprio, por ser essencialmente vida-força, é sagrado. Alimento e refeição trazem sempre uma recordação e uma concretização da ontologia e da religião.

Assim, quando o bantu deposita alimentos sobre as sepulturas realiza um ato religioso e vivencia a sua aprofunda fé. Os cemitérios e as sepulturas ocupam um lugar central na vida comunitária. Os antepassados estão neles presentes, deles brota a causalidade mística que fortifica ou debilita; através deles se robustece a solidariedade vertical. São também lugares que inspiram temor, onde o receio e o mistério permanecem.

O luto pelos mortos começa depois do enterro. As mulheres costumam pintar a cara com riscas pretas, cortam o cabelo ou soltam o penteado e até raspam todo o cabelo.

O luto obriga sobretudo os cônjuges dos falecidos, que têm que despojar-se de vestidos luxuosos e cobrir-se de panos humildes. É normal que as mulheres tragam o tronco descoberto, por que se troxessem um vestido normal, o defunto poderia reconhecê-las e atormentá-las. Aquilo em que tocar torna-se impuro e com o perigo do tabu.

A sua alimentação fica limitada e também os seus movimentos. Costumam ficar retirados em suas casas ou noutras construídas para este fim onde recebem as visitas dos familiares e a comida. Não podem cozinhar e as proibições sexuais são taxativas. Procuram evitar assim a contaminação impura do defunto, pois conservam, mais que qualquer outro, o “cheiro do morto”.

Em certos grupos, a viúva, antes de se unir a um novo marido, o que pode demorar de um a três anos, deve limpar a sua impureza relacionando-se sexualmente com um parente próximo do marido falecido. Noutros grupos, tem de seduzir um desconhecido, que ignore o tabu, e que carrega com a impureza da mulher. Se descobrir a cilada, o adivinho submetê-lo-á a ritos purificatórios.

Devem falar pouco, aparentar tristeza e chorar de vez em quando, até que o luto rigoroso termina com ritos purificatórios que começam com um banho lustral no rio. Entregam-lhes vestidos novos e os instrumentos para o trabalho. Costuma intervir o adivinho aspergindo-os.

Estes ritos conseguem “curar” os efeitos do contágio e fortificam a sua vitalidade talvez debilitada pelo contágio com o defunto. Simbolizam isso com uma fogueira acesa depois do banho, que “aquece” (revigora). Os banhos lustrais pertendem também assegurar à viúva um futuro casamento feliz.

Entre os Humbi, a água lustral leva cinco ingredientes: uma unha de galinha, casca e pedaços de certos arbustos que darão ventura ao novo casamento, pés duma erva cuja interpretação seria: ” O marido disse: fui-me embora; tu podes contrair novo matrimônio”. Por fim outra casca de árvore que significa: ” Esta pobre mulher teve pouca sorte, é preciso agora afugentar o mal que a atormentou”. A adivinha, que ritualiza a purificação, entrega-lhe pequenos enfeites e uma enxada. Marca com giz branco a viúva desnudada no peito, frente, ventre e braços. Derrama-lhe água lustral e lava-lhe com ela o corpo, até a língua. Por fim, bebe uns goles enquanto a adivinha vai pronunciando palavras mágicas que vivificam o rito. Depois simula um ato sexual.

Por fim, a adivinha recolhe toda a imundice do corpo, depois de lho esfregar com pós vegetais, amassa com isso uma bola que enterra longe das casas. O luto e os tabus ficaram sepultados. A viúva pode recomeçar a vida.

Os pais, filhos e irmãos também guardam luto, ainda que mais restritos na duração e exigências. Os viúvos e a comunidade não devem pronunciar o nome do falecido até terminar os ritos fúnebres. Como o bantu identifica o nome com a personalidade, conhecer e pronunciar o verdadeiro nome pode acionar uma influência mágica sobre a pessoa. O nome também pode contagiar o “cheiro do morto”. Outros grupos jamais pronunciam os seus nomes, ou então só depois de darem a um recém-nascido.

Fonte: Cultura Tradicional Banto – Raul Altuna

(*) Elizabeth B.Azevedo é graduada em Ciências Econômicas e pós-graduada em Matemática Financeira. Iniciada no candomblé em 1986, filha de Danguesu, neta de Saralandu, bisneta de Kianvulu e atualmente filha do Tumbalê Junçara-BA.

O SIMBOLISMO DA TERRA

 

História e Cultura: O Simbolismo da terra
Tata Giamba
O simbolismo da terra em rituais está ligado a sua ocupação, sua ligação a pessoas, amimais, vegetais, mortos ancestrais e nkisi.
O solo assume um significado especial no simbolismo quanto a sua localização e sua cor em particular: preto, vermelho e branco, ou quando empapado por sangue de sacrifícios, vinho (aguardente) azeite (óleos) se despejados como invocações ou saudações ou com água depuradora.

Lugares que são muito freqüentados são caracterizados por poderes especiais, as terras de estradas públicas, garfos (encruzilhadas) de estradas ou interseções.Outros exemplos campos de cultivo, matas, beiras de lagoas e rios e tumbas.

Outros lugares de importância são as portas de uma casa, um ritual de agressão executado neste local afetará a casa inteira seus moradores, por um outro lado um ato de benção que se usa essa terra integra a pessoa a comunidade (casa) como dará a benção a todos os moradores.

Terra do portão de uma propriedade cercada especialmente é usada em rituais antifeitiços levada da parte de trás de uma casa tem uma relação ao morto e o nkisi, e é usado em rituais de cura e de reconciliação. Graças ao nkisi que vive lá, terra levada de uma pilha de adubo é usada para rituais que garantem fertilidade.

A presença do morto soma poderes especiais para a terra que cobre uma tumba ou de um cemitério. Vários rituais fazem uso desta terra: a transferência de uma tumba, compensação para males cometidos, reconciliação, curando, proteção contra bruxas, liberdade de um pacto de sangue.

Terra de uma colina de térmita ou do ninho de uma vespa pedreiro podem ter um papel importante. Porque térmitas são organizadas em um tipo de comunidade, eles simbolizam unidade e acordo. Terra de uma colina de térmita usa restabelece unidade então em uma casa. O ninho da vespa pedreiro é muito duro. Pode esconder uma pessoa de um feitiço ou um feiticeiro.

Iniciando um aprendiz-curandeiro com terra vermelha (Lulua)

Este ritual leva o nome Kowesha mwena manga mupia-mupia buloba bukunze busopa: “Cobrindo um estudante-curandeiro com terra vermelha.” é executado por um curandeiro que está levando um aprendiz debaixo da asa dele. Ele faz isto, dentro da cabana ritual dele, à noite, com vários sócios do presente de linhagem do aprendiz para a cerimônia.

A pessoa que quer ser iniciado nas ofertas de profissão curativas uma galinha branca para o curandeiro, junto com uma soma de dinheiro. O iniciado, usando um embrulhar ao redor pano, entra na cabana ritual nos joelhos dele. O curandeiro põe uma panela ritual na frente dele para ele cuspir em. Com água preparada para purificação ritual, ele burrifica a face do aprendiz, feito e mãos, enquanto dizendo certas palavras. Então ele esfrega a terra lida no corpo iniciado. Ele diz:

“Tudi kumpala kuenu nuenu mikishi yani ne mwanetu eu udi usua kudienza mundapi. Ki nzolo mutoke eu, cilejelu cia butoke. Luayi kutudi pindieu bua kumaniayi ne nudi bilobo.”

“Nós viemos antes de você, meu nkisi, com este irmão que quer se tornar um curandeiro. Aqui é uma galinha branca, símbolo de luz. Eu o convido a vir e nos ajudar em tudo nós fazemos, de forma que ele pode saber que você é os mais poderosos de nkisi.”

O aprendiz permanecerá na cabana ritual durante uma semana sem ir fora. Ele comerá nada mais que arroz e bananas até que ele entrou na segunda fase do aprendizado dele durante o qual serão revelados os segredos da profissão a ele.

O aprendiz dá uma galinha branca como um sinal da luz que lhe permite se tornar um curandeiro profissional. Ele entra na cabana ritual nos joelhos dele enfatizar a atitude dele de respeito. Cuspindo na panela ritual, ele indica a aceitação disposta dele das condições imposta nele pela profissão de curandeiro.O professor dele lhe burrifica a face, mãos e pés para adquirir liberdade de qualquer idéia de mal que o aprendiz pode ter ou qualquer pecado que ele possa ter cometido. Cobrindo o aprendiz com terra vermelha enfatiza o poder de um curandeiro contra bruxas.

Informador: Tatu Kabwakashika, de Kalunga – Ba. B.


Terra levada do lugar de nascimento de uma pessoa.


Este ritual é chamado: Epei ontshung ele benka: “Pedindo para os antepassados poder interno.”é executado por alguém que está procurando poder, na casa velha onde ele nasceu.

Um homem que está buscando para aumentar o poder dele leva um pouco de terra do lugar onde ele nasceu, e então embrulha alguns em um pano vermelho. Ele diz:

“E djina le nu benka bie, vualie mekun ngaza lejwe ntwar zie emfeke ne bur me, mepe ver ya dree.”

“No nome de todos meus antepassados, eu entrei levar um pouco de terra de meu lugar de nascimento para obter sorte boa e força.”

Tendo dito isto, ele amarra o pano como uma bolsa. Levando um pouco de terra do local de nascimento da pessoa, a pessoa está buscando força interna adicional. Esfregando um pouco desta terra é um modo de adquirir este poder para penetrar o corpo da pessoa.

Informador: Tata Tumuke, de Bandundu – Bojanse Mpia



Libertando uma pessoa morta que está causando pesadelos (Lulua)

Este ritual é chamado Kulaba eu udi umona nyuma wa tatwende mufwe buloba bukenze: “Esfregando terra vermelha em alguém que freqüentemente sonha com o pai morto” é executado à noite por um nganga na casa do cliente.O nganga pede pagamento na forma de uma galinha, um pacote de cigarros e uma soma de dinheiro. Começar com, o nganga oferece a mão dele ao cliente que cospe nela. Então ele tira a panela ritual dele, junto com uma solução feita de terra vermelha misturada com um pouco de água e outros ingredientes. Ele esfrega esta mistura então na cama do cliente, enquanto falando. O cliente lhe dá uma panela pequena e o nganga verte nisto algumas das misturas. O paciente manterá isto a toda hora debaixo da cama dele. Nenhuma mulher é permitida tocar a panela ou varrer em sua vizinhança. O nganga diz:“Luaku buanga buani budi bundame. Bafue, bena mupongo ne tatu ukadi mufue bipacibue ne lukasa lonso. Ungenzeshe ne lukasa lonso.”
“Nkisi de proteção, eu o convido a vir a minha ajuda. Persiga o morto para fora; persiga as bruxas fora, como também o defunto deste homem. Seja rápido em ajudar.”

Os artigos pagos pelo cliente ao nganga são o preço da liberdade dele do homem morto que está o aborrecendo à noite. Cuspindo nas mãos do nganga que ele aceita a ajuda que é oferecida pelo nkisi do nganga.

Terra vermelha esfregando na cama protege o homem de ser encantado. A pequena panela colocada debaixo da cama do cliente dará garantias que será protegido. O propósito de não tocar a panela é evitar diminuir seu poder. Terra vermelha simboliza o poder que afugenta os que estão causando os pesadelos. Informador: Tatu Kabale Mukoma, de Ntumba – wa de Basukuamba Bashipayi

Escondendo pessoas da casa de feiticeiros com terra preta (Yansi)

Este ritual é chamado Eziok men mpir abwey nzo nde sam woya baleok: “Enterrando terra preta na frente da casa da pessoa para esconder de feiticeiros.” É organizado por um especialista que tem poderes de contra feiticeiros. Este ritual é feito à noite antes da família dormir. O especialista leva alguma sujeira das pegadas de cada um dos membros da família, e mistura isto com um pedaço de casca conhecido por seu poder contra feitiços , alguns dentes de serpente, e garra de gato. Ele queima tudo isto para fazer cinzas e assim obtém uma terra preta. Ele esfrega cada membro da família com esta terra, e então embrulha o resto e enterra isto no vão da porta da casa enquanto dizendo o seguinte :

“Nze mwer baleok, kal kaka nde pa, muleok kaya sam ayun nde mu nzo ye, nde yiak yekamon ata nkie mutin.”

“Feiticeiro fique aqui mesmo. Mais ninguém pode ver esta casa ou seus ocupantes.” A terra preta que ele prepara faz a casa invisível para feiticeiros.

Os artigos que são queimados mantêm distante qualquer um que lançaria feitiços na família. Cada membro da família esfrega um pouco da terra preta para ser protegido de feiticeiros.

Informador: Tata Muani, de Makiey – Ta. M.

Soprando terra branca no genro da pessoa

Este ritual leva o nome Kopakil matot ma pembe aku mwan ange abakil monit kumoha siansi: “Dando terra branca ao genro da pessoa.” É executado por uma sogra que veio se reconciliar com o genro dela. Ela faz isto na presença de vários membros da linhagem, de manhã, em casa.

Depois que um conflito estivesse resolvido entre uma sogra e o marido da filha dela, os objetos pegados anteriores um pouco de vinho de palma e uma quantidade pequena de terra branca. Ela sopra a terra branca para o genro dela, sem tocar o corpo dele. Os jogos posteriores abaixo uma moeda e um pouco de vinho de palma. Então a sogra aplica alguma da terra branca para o braço da filha dela. Ela diz:

“Bukilu yo vandaka na matata na kati na mono ti nge, kansi awa ya mono kele losila nge lupembe yayi, mono mene vutula nge basiansi na nge yonso. Vanda mbote na mwana na mono ya nkento.”

“O genro, houve alguns problemas entre nós, mas daqui em diante, agora que eu soprei esta terra de branco para você, eu lhe devolvo sua sorte boa. Maio você tem uma vida boa com minha filha.”

Terra branca simboliza liberdade e o fim da raiva da sogra. O conflito entre o homem e a sogra dele resultou na remoção da sorte boa do par. Isto foi restabelecido agora a eles. Observação pessoal, a Kindele por Ngana Mulwa.

Dando uma bênção a uma mulher divorciada


Este ritual é conhecido pelo nome Opa mukar lepiem: “Dando terra branca a uma mulher divorciada.” é conduzido pelo chefe de linhagem do marido, na presença do chefe de linhagem da mulher como também dos pais dela e de vários notáveis da aldeia que estão lá como testemunha.

Quando divórcio de um homem de uma mulher, este ritual é organizado para garantir a liberdade da mulher divorciada, e assegurar que ela ainda poderá ser capaz de dar a luz a crianças.

A linhagem principal junta um pouco de terra branca, lança isto no solo, e pede para o tio da mulher que caminhe nisto. Então ele leva um pouco mais daquela terra e esfrega isto à direita do braço da esposa do sobrinho dele que está agora divorciado dele. Ele diz:

“Me ya ne nobo mabor mimakwa. Kaa mabak mudim ako ta mabor mako. Kena kie kebisal’oo, ne mate mabi matwok.”

“De agora em diante, não há mais longo um matrimônio entre você e nós. Nós estamos divorciados. Se você acha outro marido, case. Você não tem nenhuma obrigação adicional para nós. Você foi livre dos nkisi de nossa linhagem”.

Tendo dito isto, ele dá um pouco de terra branca ao chefe de linhagem da mulher divorciada. Terra branca garante a liberdade da mulher, e assegura que ela poderá ser capaz de dar a luz a crianças apesar do conflito que existiu entre ela e o marido anterior dela. Observação pessoal, a Bunzili por Tayeye Mayanga.

Adquirindo a liberdade de um nkisi problemático

Este ritual é conhecido pelo nome Ekir men mpir kentor nkier wo bapiri: “Esfregando terra preta na cesta de um nkisi o que será lançado fora .” É executado por mais velho dos netos em uma linhagem particular, na presença do que é responsável para os rituais daquela linhagem. É à noite, em um garfo em uma estrada que já é usada.

O mais velho dos netos leva um pouco de terra preta, mistura isto com pimenta vermelha como também outras substâncias para as quais nkisi têm um repugno forte. Ele urina na terra preta, esfrega um pouco de pimenta vermelha nas palmas das mãos dele e então toca a cesta do nkisi. Ele cobre a terra preta na cesta, e então joga fora o nkisi ao garfo na estrada. Ele diz:

“Nze nkier wo, nze kiala ngwa bobe mpila mway pa kekan bi, yiak iene bi se nzol mway ekal nze pa, lomamumpiri de nze de bi.”

“nkisi, você causou muita dificuldade. Você não executou nenhum serviço útil na vida de nossa aldeia. Isto é por que nós estamos o jogando fora!”

Terra preta simboliza rejeição. As pimentas vermelhas queimam o nkisi fora o que está sendo lançado. Um garfo velho em uma estrada que já é usada é um abismo para os minkisi que são lançados fora. Eles estão impossibilitados sair deste lugar para levar vingança.
Informador: Tata Kiswama, de Kinkweni – Ta. M.

Terra preta usando para insultar o cadáver de uma pessoa má.


Este ritual é chamado Ekir men mpir mbey muur mwim akwi: “Esfregando terra preta em uma feiticeira morta.” O perito ritual chamou Ngambuimi (o que neutraliza o poder de bruxas) para executar este ritual. Ele faz assim na hora de enterro.O especialista mistura um pouco de terra preta com certos ingredientes (incluindo, entre outras coisas, o “gotas” de raio) e esfrega esta mistura no cadáver da feiticeira. Ele diz:“Nze muur wo, nze nsil ngakal ngwa bobe. Bi nze lokamunzol mway, yiak yen ndeak kwe lomamunzeok bi mpe mbwa. Akie nze lo, kabemek ayafiri ata nkie mutin!”
“Você que morreu, você é uma pessoa má. Você era uma feiticeira entre nós. Nós não queremos ter qualquer coisa que ver com você. Isso é por que nós queremos que você tenha uma partida ruim de entre nós. Nunca volte a nós.”

Terra preta impede o homem morto reintegrar na sua linhagem. Por estas palavras, a pessoa morta vem entender que ele não deve ser novamente renascido naquela linhagem.Informador: Tata Kapia, de Bandundu – Tango Muyay

Neutralizando um feitiço.


Este ritual leva o nome Oyob wo bape mwim o bense a manza mea nzil: “Lavando alguém que tem um feitiço com água misturada com terra levada de um caminho.” Um nganga executa o ritual à noite na própria casa dele.

O nganga mistura terra levada de uma estrada pública junto com alguns dos elementos do nkisi Mifi. Ele verte um pouco de vinho de palma no nkisi e diz:

“Mifi, ma mal, nwa. O zin ako, me atokoy muur wo o keyek a balok.”

“nkisi Mifi, aqui é um pouco de vinho de palma para beber. Em seu nome eu disperso os poderes noturnos deste homem.”

Tendo dito isto, ele põe a terra em uma bacia de água e lava o cliente dele. A terra levada de uma estrada pública ou caminho tem a habilidade a poder de neutralizar feitiçarias. Os ingredientes do nkisi Mifi dão um poder especial para a terra usada no ritual. Vertendo vinho de palma no nkisi, é reconhecido o poder do nkisi.Lavando o paciente com água misturaram com terra levada de uma estrada pública neutraliza o poder noturno do feiticeiro. 
Informador: Tata Mulokol, de Matamba – Wendo Nguma

Atraindo clientes com terra levada de uma interseção.


Este ritual é chamado Mumbel: “Um feitiço para atrair os clientes.”É realizado por alguém que vende vinho de palma, à noite, na casa dele.

O vendedor de vinho obtém um pouco de terra de uma interseção, mistura isto com certos ingredientes que o dão controle em cima de outros, e coloca a mistura debaixo da mesa onde ele vende o vinho. Ele diz:

“Mubel, dier mal, dier bewa a nkam kwem, dier bey. Ka ngwa kebin-kebin ne ayok ndiak ame, men ma nsi me nga nkwazir nsi me onsina mesa ma ebel bar baya amp’oyem. Mal makal amp’opwo mu nzo ye, kok bar a bal bo bwoya baya o mbok ande me. Mankier anzo, ka be ayok ndiak ame, bela bar bwoya.”

“feitiço Mumbel, aqui tem um pouco de vinho de palma, dinheiro, e uma noz de kola que eu estou lhe oferecendo. Se você realmente me ouve, pode a terra da interseção, misturada com outros ingredientes, e põe nesta pequena bolsa que eu coloquei debaixo da mesa, puxe os clientes para mim. Este vinho de palma não está vendendo, e que os que querem beber sejam atraídos aqui. Antepassados, se vocês me ouvem verdadeiramente, eu lhes peço que cumpram meu desejo.”

Terra levada das encruzilhadas representa o nkisi como também o morto. Esta terra foi caminhada pelo morto e vivendo os seres humanos e assim contém um poder especial. Tem o poder para atrair os clientes e puxa tudo esses que poderiam querer ir a outro lugar.


Informador: Tata Mukilampuyi, de Bongono – Sedeke Matatidi.


Terra esfregando de um garfo na estrada em alguém que é culpado de uma ofensa

Este ritual é chamado Etsia ishia mazianya: “Retirando a vingança de gêmeos.” É executado pelo tio materno que guarda a cesta ritual para gêmeos, e que chamou na cesta para castigar alguém que é culpado de uma ofensa. É levado a cabo na presença do culpado, ou à noite ou a manhã do dia de Mpeka. Acontece ao garfo na estrada onde que foram enterradas placentas de gêmeos ‘.

Antes de deixar a aldeia, o tio recebe um cabrito, algum dinheiro e um pedaço de pano vermelho pela pessoa culpada que está lhe pedindo que ouça a confissão dele. O tio que exerce o ritual usa o dinheiro e o pano para implorar a bênção de gêmeos que vivem na aldeia. Além, ele coloca várias moedas nas cestas rituais usadas para oferecimentos receptores.

Juntos, eles entram para um garfo na estrada. Lá, o tio faz um discurso, então enterra as moedas, amarra algumas tiras estreitas de pano vermelho a uma filial sacrifica o cabrito, e oferece seu sangue como um sacrifício. A carne do cabrito será dividida entre os membros da linhagem. O tio aplica um pouco de terra do garfo na estrada para o corpo do culpado em conclusão. Ele diz:

“Nu benkera, neseyi vue nie mpen, ekaza latol obi buan. Nejwe nzem ya beshia, nedji ntaw emfeke nan.” “Os gêmeos, entregue este malfeitor. Ele confessou o pecado dele. Aqui tem algum dinheiro e um pedaço de pano que ele está lhe oferecendo. Coma este cabrito no lugar dele”.

Dando o dinheiro e pano vermelho aos gêmeos faz lhe permite pleitear com eles retirar a vingança que infligiram.

Moedas colocando nos gêmeos ‘ mostra honra. Enterrando moedas ao garfo na estrada, súplica é feita ao nkisi de quem em cima da pessoa culpada foi dada. É aplicada terra do garfo na estrada ao corpo do culpado para entregar ao nkisi dos gêmeos. O cabrito é sacrificado, como um sacrifício no lugar da pessoa culpada que confessou o mal dele recentemente. Como eles compartilham a carne do cabrito sacrificado, todo o mundo regozija no fato que unidade foi restabelecida. Terra do garfo na estrada representa o nkisi dos gêmeos.


Informador: Tata Osongo, de Bandundu – Bojanse Mpia


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sábado, 25 de julho de 2020

OS GUERREIROS JAGAS


História e Cultura: Os Guerreiros Jagas
Mam’etu Nibojí(*)
Assim como os Zulus, outra nação que se notabilizou pela experiência guerreira foi a Nação Jaga.

Comumente acusados de bárbaros e antropófagos, os Jagas têm sua origem controvertida. Ralph Delgado (1946), por exemplo, escreve:

“Merecem registro algumas opiniões coesas, emitidas a respeito dessas tribos aguerridas e bárbaras. Battel, vivendo entre os Jagas no primeiro decênio do século XVII, afirmou ser impossível, a Duarte Lopes, possuir um conhecimento perfeito da origem dos Jagas, pois os Cristãos, nessa época, apenas sabiam o que incertamente se conjeturava, a tal respeito. Disse, ainda, que os Portugueses lhes chamavam Jagas, enquanto eles se denominavam, a si próprios, de Imbengalas, provindo da Serra Leoa; que eram grandes comedores de carne humana, pela qual recusavam a de vaca ou cabra, não possuindo morada fixa; e que uma horda de 12.000 negros, sob o comando de Ebembe, se instalara em Benguela, doze graus ao sul da zona, aqui reinando e prosperando.

Duarte Lopes emitiu a opinião de que os Jagas, também chamados Jindes, vieram de ‘Monemuji’, Leste de Angola, na região dos lagos nascentes do rio Nilo. Cavazzi, por sua vez, escreveu que os Jagas, ou Sumbis, apareceram no Congo, em meados do século XVI, capitaneados por Zimbo, que se apossou do Reino, dividindo o seu exército em grupos conquistadores de diferentes regiões. Um desses grupos, chefiados pela sua mulher, a feroz Temba-Ndumba, caminharia até a Serra Leoa; outro, comandado por Quizuva, lugar-tenente do chefe, largaria à conquista de Moçambique, sendo batido em Tete, pelos portugueses. Correndo em auxílio de Quizuva, Zimbo, a princípio vitorioso, foi batido em Melinde, após o que transpôs o Zambeze, vindo estabelecer-se nas margens do Cunene, na região do Humbe, formando a hipótese de Capelo e Ivens.Ravenstein, finalmente, apoiado em Douville, considerou o vocábulo Jaga ou Jaka como título guerreiro e não como nome de um povo; acrescentando que os bandos antropófagos incluíam elementos de toda a espécie, não diferindo muito dos Zulus, daqui provindo um dos nomes porque eram conhecidas em Angola: Bângalas. Parecendo esta interpretação mais ajustada à verdade dos fatos, a hipótese de que os Anzicos, também antropófagos, participassem da onda avassaladora do Congo, frisada no texto, não se apresenta com cores inaceitáveis de fenômeno problemático, antes como certeza incontroversa, corroborada pela seguinte passagem do Copiador de Angola, de 1779, do Arquivo Colonial: “Os Jagas de Anzica, juntos com outros povos bárbaros que ficam ao oriente dela, assaltaram repentinamente, devastando, queimando e destruindo quando encontraram, e obrigaram o rei do Congo, chamado D. Álvaro a refugiar-se, com os seus que o quiseram seguir, em parte onde pudesse escapar à fúria dos inimigos”.

Por volta de 1570, vindos do Congo (Almeida, 1978), os Jagas chegam a Matamba, onde se misturam à população local, dando origem ao povo Imbangola ou Imbangala e constituindo os reinos de Huíla (capital Huíla) e Humbi (capital Mutano). E de Matamba, ao sul de Anzico, descem para “o país do jaga Caçanje, separado de Benguela pelo Alto Cunene” (Capelo e Ivens II).

No final do século XV o jaga Zimbo, rei de Matamba teria conquistado o Ndongo e entregue a seu filho, originando-se, aí, a linhagem da Rainha Nzinga. E quem isto afirma é Roy Glasgow (1982) que, baseado em relatos antigos, assim descreve os Jagas a suas técnicas militares:

“Os Jagas eram imponentemente altos e atacavam seus inimigos com facas, lanças, arcos e flechas, azagaias e escudos. Eram táticas militares cujo artifício operacional era a surpresa. As mulheres Jagas não criavam seus filhos, mas os abandonavam nos bosques, adotando no lugar deles, adolescentes capturados na guerra. Estes alcançavam a liberdade e a virilidade, trazendo a cabeça de um inimigo a seu general.” Observe-se, aqui, que o texto de Glasgow se baseia em escritos quinhentistas portugueses em que os exageros e a ótica racista são constantes. Mas deixemo-lo prosseguir: “Os Jagas viviam em acampamentos muito bem vigiados, os quilombos. A competência profissional e a disciplina eram mantidas por meios de freqüentes (provavelmente diários) exercícios militares. (…)”

“Os Jagas selecionavam com cuidado seu acampamento de guerra, escolhendo de preferência uma localidade perto de um precipício. A seleção da localidade era responsabilidade de seu general, e dos chefes religiosos, que subseqüentemente supervisionavam a construção do acampamento circular, cercado de doze fortes estacas, cada uma vigiada por um capitão e que proporcionava a base de um elaborado sistema de segurança.”

Veja-se, aí, como a descrição de Glasgow se parece com as que temos sobre os quilombos de Palmares, no Brasil. E isto nos leva a pensar como já vimos páginas atrás com D. Oruno D. Lara, na possibilidade da origem jaga dos chefes palmarinos.

(*) Elizabeth B.Azevedo é graduada em Ciências Econômicas e pós-graduada em Matemática Financeira. Iniciada no candomblé em 1986, filha de Danguesu, neta de Saralandu, bisneta de Kianvulu e atualmente filha do Tumbalê Junçara-BA.

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CONCEITO DE TEMPO


História e Cultura: NTÂNGU – Conceito de Tempo
Kambamenha
Lokula (lo) – A hora

O Mukongo se serve do sol (ntângu) para fixar e ordenar seu tempo. Ele distingue a partir da posição do sol, das horas principais (lo biangudi), e das horas intermediárias ou secundárias lo biandwelo, (bianzâmbuka). Assim, existem oito horas no sistema Kôngo que é baseado no conceito cosmológico descrito no N’KONGO YE NZA YAKU-N’ZUNGIDILA: NZA KONGO (FU-KIAU, 1969).
 As quatro horas principais – lo biangudi, correspondem às quatro cores cósmicas principais e aos quatro pontos principais de marcação dessa cosmogonia. Isso aqui não é somente Kôngo mas, há muitos pontos de vista comum a todos os povos Bantu em particular e africanos em geral.

A primeira hora principal é Nseluk’a ntângu ou mais simplesmente n’suka / nseluka (manhã/levantar). A nseluka é a hora correspondente à kala – ser, o símbolo da vitalidade (fogo) que reanima toda vida. A nseluka é a hora de reviver ku nseke, na comunidade do mundo acima, o mundo físico. É a hora onde o responsável da comunidade, o mfumu-dikanda, passa em revista todas as famílias – mabuta (plural de buta), para se assegurar de sua boa saúde e sobretudo, se elas estão bem acordadas, despertas com força – sikama ye ngolo. Nseluka é também chamada a hora de meditação e de profecia pois ela une e separa o dia e a noite – bunda ye vambisa mwini ye futu. É a hora onde os membros da comunidade fazem visitas aos doentes (vûnga mbevo – visitar doentes). É a hora testemunha das atividades diurnas e noturnas. Nseluka é a hora de emergência à vida – lo kia nsensolo a biobio ku moyo. Notemos aqui ligeiramente que a palavra nsensolo, da raiz verbal sènsa – desenvolver-se, elevar-se a partir de um líquido, é uma palavra importante na linguagem simbólica Kôngo.

 A segunda hora principal do sistema horário Kôngo é a Ntângu – a – mbata ou Kunda, correspondente ao Tukula, o vermelho. É a hora de peso, de importância – lo kia dema, a hora densa quando tudo acontece. Toda vida busca refugio para escapar ao peso do tempo. É a hora do majestoso princípio de vida – lo kia n’kingu-nzâmbi , a hora do princípio-deus. É a hora simbólica da autoridade sagrada na comunidade, aquela do mfumu-dikanda e de todos os simbi bia nsi, os gênios sociais. É a hora do ”autocontrole”.

Entre essas duas primeiras horas principais há a primeira hora secundária ; é a kinsâmina, Mayanama ou Ntângu-a-kedi. Kinsâmina ou Mayanama é a hora de pequeno sol, kinsâmina, quando os anciãos saem de sua casa para se oferecer ao pequeno sol yanama; é também a hora onde os coletores de nsamba – o soro, a seiva vegetal produto da palmeira de óleo, se encontram com seus clientes no sokolo. É o momento onde se bebe esse soro africano, único no mundo. Durante essa hora se rende homenagem aos ancestrais pelo ritual de Tafuna makazu com a noz de cola, kazu, que tem um papel importante. Em seguida as aldeias ficam quase desérticas porque cada um se entrega à sua tarefa do dia.

Kinsâmina, em nossa tradição – kinkulu, era também, como ela é ainda hoje, a hora favorável para resolver as discussões ou todas as questões concernentes ao interesse da comunidade e de seus membros.

A terceira hora principal do sistema horário Kôngo é a ndimina, o pôr do sol. Essa hora corresponde ao luvemba, da raiz verbal “vemba”, tornar-se cinzento (falam de cavalo), branquear, envelhecer, ser enfraquecido psiquicamente pelo fato de luvemba – elemento negativo causa da velhice e da morte psíquica. A luvemba é então ela mesma o símbolo da morte, quer dizer, de mudança. É a hora onde a natureza está abandonada às forças e princípios invisíveis que lhe insuflam uma nova vida para o dia seguinte. É também nesse momento que se abrem às portas de mpemba, o mundo dos ancestrais, para conduzir as almas dos mortos. É a hora onde todo mundo se encontra sob o abrigo comunitário na aldeia para partilhar a refeição do começo da noite n’lekolo (de leka – dormir), refeição que se opõe ao m’buluku (de buluka ; kika vumu – meter qualquer coisa como um calo pelo estômago) a refeição da manhã. Ndimina é a hora dos “masamuna, n’samuni” ou “n’tambikisi”- dos gritos e das grandes transmissões orais – “lo mu loguka tambula ye tambikisa mu kanda ye mu kinvuka “ (a hora de se adquirir essa arte de receber e transmitir na comunidade e na sociedade).

Como nseluka, ndimina é também uma hora de mediação. Ndimina é a hora de submergência de tudo pela morte psíquica (lo kia ndiâmunu a biabio). Notemos aqui que as palavras ndimina e ndiâmunu, respectivamente de raízes verbais dimina e diâma – submergir, descer sob a água – são palavras importantes na linguagem simbólica Kôngo. Nós retornaremos a esse assunto também.

Entre a segunda e terceira horas principais há a segunda hora secundária, a nsinsa, m’ vèngo ou ntângu-malemba. A nsinsa ou malemba é a hora quando as instituições como Lemba terminam seu horário diário do kongo (aqui a palavra kongo significa lugar da instituição, chamada também kânga ou lônde) para recuperar, depois dessa vida esotérica de kânga (kôngo, lônde), a vida comum na comunidade. Mas é também a hora quando as entradas das aldeias devem ser abençoadas – lemba mafula ma vata, para evitar os perigos enquanto a comunidade dorme. É a hora quando os n’songi – coletores do nsâmba – soro vegetal, retornam de sua atividade, mu kwenda vutula mbele. Para os caçadores – nkongo (não confundir com n’kôngo o habitante do país Kôngo), é a hora de n’kôndo, a caça individual.

A quarta hora principal é a dingi-dingi ou n’dingu-a-nsi. A dingi-dingi é a hora que corresponde ao musoni (o amarelo). É o meio ku mpemba – o mundo de baixo (o mundo das profundezas, o mundo dos ancestrais). A dingi-dingi – da raiz verbal dinga e dingalala (buscar tudo estando calmo interiormente), é a hora dos mistérios insondáveis . Ela é considerada como o momento de grandes sonhos e de pensamentos profundos. É a hora da nsûsil’a simbi bia kanda kwa kanda (quando os membros da comunidade têm acesso através dos sonhos, aos dons geniais). É a hora do n’tu-tolo – o subconsciente; lit. a cabeça ativa no sono. O sentido literal da expressão “n’dingu-a-nsi” é “maneira de buscar o mundo”, o cosmos. Para aqueles que buscam (dinga) a kindoki (ciência) principalmente, n’dingu-a-nsi é a hora da plena e profunda atividade no silêncio (dinga mu dingalala). Porque a kindoki (ciência) operava e opera sobre as coisas profundas e num silêncio quase total, os biyinga – os não iniciados na matéria, têm uma certa desconfiança dela e a têm considerado finalmente, assim como a autoridade, como anti-comunitária, tal nos explica esse provérbio Kôngo: “Luyâlu ye kindoki m’vângi ye m’bungi mia kânda” – a autoridade e a ciência constroem e destroem a comunidade. A autoridade e a ciência, mesmo de nossos dias, como os Kôngo o tem exposto na sua filosofia, são os maiores fatores de construção e destruição da sociedade humana e do mundo no qual nós vivemos. Não é surpreendente que a terminologia “kindoki” tenha perdido seu sentido de Ciência. A experiência tem mostrado, mesmo em nossos dias, que as palavras de uma língua mudam os significados conforme as épocas, as atitudes dos dirigentes e seus efeitos sobre a vida comunitária. Por causa dos abusos dos políticos em certos países africanos, a palavra “política” tem perdido seu verdadeiro sentido depois da independência e se revestido de um sentido muito pejorativo. Para mais de 85% de africanos, a política, “poluka” como os Kongo a chamam, é a arte de enganar, de roubar e matar. Jamais um mukongo nos diria que a política, tal qual nós a vivemos hoje em África, seria sinônimo de seu conceito de kinzonzi.

 A autoridade e a ciência tornam-se prejudiciais à comunidade quando elas operam nas câmaras negras sem a participação comunitária. Trabalhar no n’dingu-a-nsi não quer dizer agir fora do plano de suas responsabilidades humanas e comunitárias, mas tentar descobrir, pela reflexão, aquilo que o homem ignora, para assegurar mais paz no mundo.

Entre a terceira e quarta horas principais se acha a terceira hora secundária que é a malu-ma-tulu ou malu, hora do sono. A malu-ma-tulu é a hora em que cada indivíduo é tido como ser presente em seu aposento, ou no kiânzala (o pátio) ou no mbongi (cabana), a casa pública onde se discutem todas as questões de ordem política, religiosa, sócio-econômica, filosófica, diplomática, etc. Antes dessa hora, o mfumu-dikanda – chefe líder da comunidade, passa em revista todas as famílias da comunidade e pergunta a cada um se todos os seus membros (bièla) estão presentes. Do contrário ele ordena a seus “bilesi” (militantes) de conduzir imediatamente uma sindicância – dia matèmbo, langa. O chefe não poderá dormir antes de ter adquirido a certeza que o membro procurado se encontra bem na comunidade.

Se o desaparecido não for encontrado depois do ndîlu a matèmbo, o chefe ordena então aos bindôkila, chamada de alarme lançada em todas as direções em torno da aldeia, “mafula ma vata”. Se os binomial não dão resposta o chefe se informa junto aos que viram o membro ausente por último durante a jornada – mwîni e da direção para a qual ele teria ido- lusunga lukatadisîngi. Esses indícios lhe permitem pedir à comunidade em última fase de ”kwika binga” (apanhar fogo) e ir através os campos e florestas, à procura do membro declarado desaparecido. Entre esse tempo o telegrafista – siki kia nkônko (tambikisi kia n’samu mu minika ye miningu) envia suas mensagens nas comunidades próximas e afastadas para lhes perguntar se não teriam visto “mbadio”- palavra utilizada, entre outras, para dizer um tal, X). Toda comunidade desde que consegue captar a mensagem é obrigada a responder por o kansi ka tumweni ko (quando não o viram) ou por va kaviôkele ou va kena, se o viram passar por ali ou se ele está ali. A arte de enviar os sinais e as mensagens é um dos mais perigosos em nossas tradições uma vez que pode custar a vida do telegrafista se a mensagem não é corretamente transmitida. Enviar uma mensagem que anuncia a morte de um chefe em lugar da gravidade de seu estado, por exemplo, seria um crime. Em tais circunstâncias o telegrafista é sofrível à pena capital: ser enterrado vivo antes de tendo de confessar publicamente os erros técnicos graves, que podem paralisar não somente a vida da comunidade mas também a de seus aliados.

Entre a quarta e a primeira horas principais tem a quarta hora secundária, a makielo, também chamada makielo – ma – bwisi ou nkala mpumbu. Makielo é a hora dos emissários, dos mensageiros, das grandes viagens assim como aquela dos ataques e das guerras (lo kia mumbwila ye mvita). Ela é também considerada como a hora de saudar (aos doentes) na comunidade, de mvûngulu a bakindakana ye mbevo mu kanda ye zinga – visita aos doentes. É nesse momento aí que o mfumo-dikanda faz suas invocações matinais e ordena os ataques sociais – ta bibila – contra as comunidades (kanda) onde ele desposou mulheres. Freqüentemente essas bibila são acompanhadas dum grande número de instrumentos musicais – mpungi, ngôngi, vudinga, tânda, ngoma, bandi, nsiba, minsiele, etc. É a hora de bênçãos para certas comunidades mas também uma hora cheia de problemas e angústias para aqueles quando busi bia kanda – as irmãs da comunidade têm problemas sérios para elas próprias ou para suas crianças nas suas comunidades temporárias, onde elas vivem com seus maridos: doenças de crianças, infidelidade do marido, doença da mulher, tentativa de envenenamento do marido, etc. A comunidade permanente da mulher pode ser atacada por aquela de seu marido por uma dessas razões. É em tais circunstâncias que a kinzonzi kongo, sua dialética, nos fornece a informação da mais rica, dinâmica e viva, sobretudo na utilização da canção – n’kinga, do provérbio – nganga, do slogan – kumu, de comissões ou grupos de busca – mfûndu e da participação popular muito ativa.

Makielo, é a hora testemunha do recomeço espiral do tempo e dos fenômenos naturais no curso de sua evolução permanente. A concepção de tempo-hora (lôkula), de tempo-período (tando) e do mundo (nza) seria impossível ao mukôngo como a todos os povos africanos sem esse conceito muito claro do sol, sua máquina-tempo.

Texto original em francês

Autor – FU-KIAU -Tradução para o português – Valdina Pinto

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domingo, 14 de junho de 2020

OS ANIMAIS NOS MÉTODOS DE ADIVINHAÇÃO




História e Cultura: Os animais nos métodos de adivinhação

Lecy Picorelli

Métodos de adivinhação são extremamente freqüentes nas sociedades tribais em todos os continentes. São constituintes importantes na cosmologia destes povos e portanto seu estudo torna-se uma das maneiras mais eficientes de apreensão do universo cultural a que pertencem.

É o “fato social total” de Durkheim, ou seja, um fato social cujo estudo revela a totalidade da cultura. Seu simbolismo é muito rico e se apóia em materiais os mais diversos que vão de objetos manufaturados, plantas e búzios a partes de animais ou animais inteiros e seus comportamentos em circunstâncias específicas: entre os índios das Américas é comum a interpretação do comportamento dos pássaros – alguns remanescentes passaram para as sociedades complexas como presságios, aviso de chuva etc., comum entre nós; na África, um dos continentes mais ricos em métodos de adivinhação, o uso de animais é mais freqüente do que em outras regiões.

A adivinhação é uma constante, por exemplo, entre as culturas Bantu da África Central – sobretudo nas etnias Chokwe, Lwena, Lucazi, Lunda, Ndembu, Ovimbundu, Ngangela, Lwimbi, Nyemba e Rotse – veremos alguns exemplos da etnia Cokwe de Angola – o “NGOMBO” ou arte da prática adivinhatória.

Os Chokwe distinguem três categorias de especialistas que podem intervir em seus problemas: o ADIVINHO, o CURANDEIRO e o FEITICEIRO.


O primeiro, o Adivinho interpreta os fatos primariamente em função de forças positivas. O segundo, o curandeiro é um prático que tem grande conhecimento do poder curativo de plantas e de como usá-las ritualisticamente. O terceiro, o feiticeiro lida com forças negativas que ele manipula contra suas vítimas.O adivinho lida diretamente com o espírito dos ancestrais, principalmente o dos grandes chefes fundadores dos grupos.

Estes espíritos são venerados de diversas maneiras sendo a mais característica o exercício de uma atividade profissional, ou seja, um indivíduo consagrado a um espírito deverá exercer a atividade profissional que o espírito exercia.

O adivinho é um dos maiores exemplos disso: exerce esta atividade em honra do espírito ancestral a que é consagrado e o exercício mesmo desta atividade é seu maior ato de veneração. Os feiticeiros, lidando com as forças do mal, são a causa das doenças e uma constante ameaça à população.

Alguns autores chegam a afirmar que a atividade do adivinho é comparável à de um detetive psicológico que deve pesquisar e descobrir as feitiçarias. Isto dá um grande status ao adivinho e no caso dos Chokwe, este status é reforçado pelo fato de que normalmente o adivinho é o próprio chefe da aldeia.

A coragem de denunciar o feiticeiro demanda uma boa dose de prestígio assim como grande conhecimento das forças ocultas em ação. Para isto a iniciação tem papel fundamental: somente após uma severa iniciação o adivinho será reconhecido.

A iniciação consiste de sacrifícios aos ancestrais e meses de aprendizado com o adivinho iniciador.

Ngunzu, como é conhecida esta arte na região, significa tanto o cesto usado na adivinhação quanto o espírito do ancestral que preside os atos de adivinhação, que ajuda o adivinho a adivinhar.

Vários símbolos são usados neste cesto. Símbolos animais são abundantes: o adivinho escolhe certas espécies animais e relaciona seus comportamentos com os problemas concretos trazidos pelos clientes.

A razão da escolha de certas espécies é difícil de explicar. Muitas vezes, aos animais reais são atribuídos traços que os torna fantásticos ou monstruosos, portanto simbólicos e adequados à interpretação adivinhatória.

Existem também as restrições que envolvem animais, principalmente os que fazem parte do grupo usado nas adivinhações.

Por exemplo: quando um caçador caça um leão (mwanangana na adivinhação), uma pantera (cisenga) ou um tamanduá (njimbo), lhes são interditadas as relações sexuais por três dias porque estes animais “são como pessoas” – o leão e a pantera simbolizam o chefe da terra e o tamanduá, que habita em buracos na terra, são como mortos, isto é, seres humanos.

PARTES DE ANIMAIS USADAS NOS CESTOS ADVINHATÓRIOS


- pequeno chifre de antílope – o movimento balanceado com relação a pontos brancos e vermelhos pintados no cesto, respondem sim/não (bem/mal) a questões formuladas na sessão.

- pata dianteira de macaco – sua aparição é um bom presságio, o problema vai se resolver.

- pangolim - (um animal parecido com um tatu) – usado para males femininos.

- pata de tamanduá – símbolo do passado, tudo o que está perdido no tempo.

- espinho de porco-espinho – sua aparição na borda do cesto significa algo muito negativo.

-“o espírito do caçador” – caçar é uma atividade muito valorizada e particularmente perigosa, por isso todas as suas interdições rituais. Aqui é usado o dente de um animal abatido em caçada, envolto em tecido vermelho.

A aparição deste dente na borda do cesto significa exigências do espírito ancestral quanto ao exercício da caça.

- garra ou unha da águia-real (a maior águia africana) – indica que o problema é causado por feitiçaria.

- pata de um animal chamado kambango – indica manifestação do mal

- pena vermelha de um pássaro chamado nduwa – problemas relacionados com os mortos.

- carapaça da tartaruga – proteção ao ato adivinhatório.

- pata de lagarto das chuvas – denuncia amores secretos.

- cabeça de camaleão – doenças causadas por feitiçaria.

- cabeça de serpente – o mal foi causado por uma cobra enviada por um feiticeiro.

- búzio (carapaça de animal marinho) – usado em questões de gravidez/fecundidade.- são usados ossos, chifres e garras de vários outros animais.

Todos estes elementos são colocados no cesto adivinhatório (um pequeno cesto de palha – quase como um chapéu de palha, com o fundo decorado com pele de gato selvagem ou outros animais, às vezes com casco de tartaruga ou com cabaça).

Na sessão, este cesto é “sacudido” e os elementos que aparecem por cima são interpretados. O cesto é sacudido várias vezes de acordo com o diálogo entre o adivinho e o cliente.

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CONFECÇÃO DE UM NKISI



História e Cultura: Confecção de um Nkisi
Tata Giamba

No princípio, todo Nkondi de nkisi é feito por dois integrantes da comunidade e trabalham junto. Um é o escultor cujo trabalho é esculpir uma figura que aparece cheio de força, e o outro é um nganga, um perito em rituais.
O nganga soma substâncias e materiais que dão para esta figura seu espírito e poder. De acordo com uma autoridade nomeada Nsemi Isaki, nkisi “é o nome de uma coisa nós usamos para ajudar um homem quando ele está doente e de qual nós obtemos saúde; o nome se refere a folhas e medicamentos combinados juntos”. O nganga sabe o poder, positivo e negativo, de muitas substâncias naturais.

Ele cria pacotes de medicamento que contêm misturas complexas e então prendem alguns deles ao redor do pescoço da figura e inserem outros no recipiente que é sua barriga. Nsemi Isaki disse, “medicamentos colocados em um nkisi são … forças em seu corpo para ajudar a trabalhar”. O nkisi é como é mas se falta medicamentos, não podem fazer uma coisa. Assim, o nkisi tem medicamentos, eles são sua força, e suas mãos e pés e olhos. Por causa disso, o nkisi é usado pela comunidade, com o passar do tempo adquire muitas lâminas, cunhas, e mais medicamentos. Assim, realmente é a criação de muitas mãos, que cada um soma a seu poder.

Fonte: As observações de Nsemi Isaki foram registradas 1900 ao redor, e pode ser achado em John M. Janzen e o livro de Wyatt MacGaffey, Um fio de Antologia Religião de Kongo: Textos primários do Baixo Zaire (Lawrence, A Universidade de Publicações de Kansas em Antropologia, 1974).